NEURÓTICO, EU?

O termo NEUROSE foi proposto pelo médico escocês em 1769 para definir as doenças relacionadas aos “nervos”, que causavam distúrbios da personalidade. Posteriormente foi popularizado na França por Philippe Pinel (Sim, foi por causa dele que Pinel virou nome de hospitais e gíria para “louco”).  Sigmund Freud se apropria do termo para designar uma condição nervosa cujos sintomas simbolizam um conflito cuja origem se dá na infância.Imagem1

Na construção histórica da psicanálise, a neurose passa a designar não uma doença, mas um modo de funcionamento. Uma maneira de ser na realidade e de se relacionar com o sofrimento. Popularmente o termo se tornou sinônimo de “normalidade”. (Já que os “anormais” seriam psicóticos e perversos).

O neurótico é aquele que, diante da impossibilidade da realização de um desejo (ser, ter, fazer…) em função de uma privação, frustração, repressão, negação, vai promover o RECALCAMENTO. Em bom português, vai engavetar, “deixar para lá”, ignorar e fingir que não existe ou que não importa. Obviamente não funciona 100%, por isso é comum ouvirmos que temos de lidar com nossas “neuras”. O retorno deste recalcado.

Ele se dará de três maneiras básicas. Por meio do corpo (sintoma); de uma ideia/pensamento (obsessão) ou através de um objeto (fobia). Esse conteúdo recalcado possui prazo de validade para permanecer inerte, inconsciente. Cedo ou tarde vai reivindicar uma resposta, um movimento: “a voz do inconsciente é sutil, mas não descansa até ser ouvida” (Freud).
Isso pode se dar por meio dos sonhos, daquelas “piadas” com fundo de verdade, dos lapsos e dos atos falhos. Porém, talvez o modo mais preocupante seja por meio de SINTOMAS (conversão, obsessão, fobia) ou seja, associado a doenças.

Os sintomas podem ser físicos, o que chamamos de conversão (que não é crônica): Ter uma diarreia às vésperas de uma prova, uma dor de cabeça momentos depois de uma reunião de trabalho, dores que se deslocam pelo corpo sem causa aparente. Mas podem ser também psíquicos: Compulsão por compras, insônia, falta de apetite, dificuldade de concentração ou aquelas eternas repetições que nos assolam, como a mulher que julga possuir um “dedo podre” para relações. Vale lembrar que é necessário diferenciar conversão de somatização. Neste segundo caso, é possível, por meio de exames, se chegar a um diagnóstico que confirme uma patologia, como nos casos de gastrite, úlcera, hipertensão, etc.

A psicanálise não trabalha com diagnósticos da mesma forma como a psiquiatria, por exemplo, justamente por entender que nem todo sofrimento é doença, e nem toda definição traduz o real sofrimento do sujeito. Patologia vem de PATHOS, que é doença, mas também é sofrimento, justamente objeto que a psicanálise visa tratar. A ação do psicanalista visa a ANGÚSTIA do sujeito. E ela está diretamente ligada à falta. O neurótico é marcado, há nele um registro, uma divisão. Assim, não existe um “indivíduo” (que não se divide). Mas sim um “ser faltante destinado à incompletude”.neurotico 2

Assim, o neurótico é um ETERNO INSATISFEITO. Ele reconhece-se como ser faltante embora não saiba nomear a falta, busca tapá-la, elege um objeto para tal e, se não consegue, sofre. Porém, se consegue, descobre que não era bem isso que desejava. Passa então a desejar outra coisa. Um pêndulo entre tédio e sofrimento, conforme Schopenhauer:

“Portanto, entre querer e alcançar, flui sem cessar toda a vida humana. O desejo, por sua própria natureza, é dor; já a satisfação logo provoca saciedade; o fim fora apenas aparente; a posse elimina a excitação, porém o desejo, a necessidade aparece em nova figura; quando não, segue-o o langor, o vazio, o tédio, contra os quais a luta é tão atormentadora quanto contra a necessidade”.

Filosofia Moderna on Twitter: "Para Schopenhauer, é essa a sua vida.  https://t.co/FmJqX41688" / Twitter

Esse conflito entre desejar o que não se tem e não desejar mais o que se tem, traz o desconforto difícil de administrar. Reconhecer que essa falta é constitutiva é um passo para lidar melhor com a insatisfação. Porém, o preço é ter de conviver com a ideia de que seu desejo não pode ser realizado e, se puder, não será suficiente.

Alessandro Poveda
Psicanalista SAC
(11) 94945-8735

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